Alimentando Preconceitos
Após perceber que mesmo astrólogos (e pessoas que se dizem estudiosas do assunto) estavam presos num círculo vicioso de culpar um ou outro fator simbólico pela própria conduta ou pela conduta alheia, comecei a imaginar como seria o dia em que a Astrologia fosse, de uma vez por todas, incorporada no nosso cotidiano como uma ferramenta de auxílio em tomadas de decisão e em auto-conhecimento.

Arianos "grosseiros e encrenqueiros", taurinos "teimosos e gananciosos", geminianos "intrometidos e fofoqueiros", cancerianos "medrosos e grudentos", leoninos "cheios de si e egocêntricos", virginianos "chatos e complicados", librianos "dependentes e interesseiros", escorpianos "obcecados e desconfiados de boas intenções", sagitarianos "fúteis e donos da verdade", capricornianos "desanimadores e auto-defensivos", aquarianos "hipócritas e falsos" e piscianos "que se consideram sempre vítimas e evasivos".
 
Aí está um pequeno dicionário coletado de milhões de outros atributos negativos que se costuma ouvir de pessoas que estudam a Astrologia, desde aquelas que estão começando a se interessar até os profissionais do ramo. Se fôssemos lançar as bases de uma nova guerra, ainda teríamos muitos outros xingamentos interessantes, gerados pela falta de consciência de quem mexe com essas coisas. De que adianta tanto esforço no sentido de aprender esta arte se os preconceitos tornam-se ainda maiores, devido ao fato de que não há esforço algum por aperfeiçoamento. "Odeio arianos", ouve-se um canceriano dizer, "Capricorniano é um porre", diz um geminiano.
 
Afinal de contas, para quê estudamos Astrologia? Qual a finalidade de entender mais as qualidades e debilidades do ser humano, se a única coisa que conseguimos fazer é criticar sob nosso ponto de vista egótico, sem dar nenhuma solução. E qual será a solução, se os preconceitos aumentam a cada volume de conhecimento adquirido?
 
Imaginem uma empresa do futuro procurando indivíduos com iniciativa, com capacidade comunicativa e visão futurista. De imediato, o empregador que dispõe de um entendimento parcial dos símbolos astrológicos, baseado em seus preconceitos, descartará todos os librianos, taurinos, piscianos e assim por diante. Se ele não considerar que tais indivíduos possam ter outros fatores que indiquem tais atributos, certamente pessoas altamente capacitadas para o emprego serão ignoradas. Há que se considerar igualmente a capacidade de transcender as próprias limitações que cada indivíduo tem. Não adianta julgar. Nossa experiência de vida nos coloca diante de pessoas que virão a preencher nossa existência de conteúdo, fazendo com que possamos adaptar as condições oferecidas para o temperamento de cada um.
 
O problema é muito maior do que se imagina. Pelo crescente interesse no estudo esotérico, pela disseminação dos cursos e pela possibilidade cada vez mais forte de reconhecimento desses estudos pelos órgãos sociais competentes, é preciso estender o interesse do conhecimento puramente "técnico" da Astrologia para algo amplamente voltado para a convivência e a tolerância do próximo. Quando digo técnico, me refiro ao jargão profissional que não leva em conta o quanto estamos sendo exclusivistas em nossos pontos de vista. Com isso, acabamos esquecendo que uma pessoa pode muito bem dedicar-se a qualquer área que escolha e que se sinta bem, sem que seja administrada como marionete pelos símbolos astrológicos.
 
Para se ter uma idéia, dois fatos reais - dois de muitos outros semelhantes - provenientes do meio astrológico, ilustram essa afirmação:
 
1 - Um amigo muito dedicado à Astrologia, resolveu participar de uma palestra ministrada por uma eminente espiritualista. Durante a apresentação, os participantes, a pedido da palestrante, citaram seus signos Ascendentes, Solares e Lunares, bem como sua profissão. Este amigo, tem seu Sol em Áries e, ao citar seu interesse pela Astrologia, foi admoestado por uma colega taurina, no sentido de que arianos "...não podem ser astrólogos, pois somente poderiam se dedicar a atividades de liderança. Eles são turbulentos, não têm aquela imagem dos sábios tradicionais". A resposta foi deveras interessante: "Já que eu não posso ser astrólogo por ser ariano, o que uma taurina faz numa palestra espiritualista, uma vez que o signo de Touro está ligado ao simbolismo da matéria e da geração de recursos? Você não se sentiria melhor se estivesse agora mesmo investindo no mercado financeiro ou em algo mais objetivo? Dane Rudhyar era ariano e foi um dos maiores astrólogos que se tem notícia".
 
Ele ainda se esqueceu de citar nomes como o do falecido Howard Sasportas e de Alan Oken, dois astrólogos famosíssimos, com Sol em Áries.
 
É claro que certas pessoas diriam: "mas fulano tem a lua em aquário", ou "ela tem Urano na casa 1", como se isso fosse fator obrigatório para se dedicar a esse assunto. Robert Hand, um dos mais talentosos astrólogos da modernidade, não tem com tanta evidência atributos astrológicos em seu mapa. Se formos pela cabeça das pessoas acima ele deveria ser gourmet, advogado ou filósofo, antes de qualquer coisa. Acontece que ele resgatou seu potencial para esta arte de dentro de si mesmo. Não dependeu de "influências".
 
2 - O nosso segundo exemplo é o do jovem professor leonino, exuberante em sua forma de passar conhecimento, criticado duramente pela aluna virginiana que chegara do México há pouco tempo, onde estudara com um astrólogo famoso naquele país. No meio de uma explicação acerca de pesquisas feitas por ele a respeito de aspectos menores no mapa de nascimento, ela interveio com dedo em riste, dizendo que toda aquela história não passava de "egocentrismo leonino" e que ela havia estudado no México e comprovou a ineficácia do que ele estava dizendo. Ora, sem contar com o fato de que ela estava projetando o próprio egocentrismo sobre o rapaz, ela esqueceu de seu "problema" virginiano de corrigir, o chamado "complexo de eu sei tudo". Pergunto novamente aos leitores: de que adiantou tanto esforço? No fim das contas, o professor respirou fundo, conteve (como era de se esperar, pela conscientização da força que tinha) a fúria de seu Marte na primeira casa, e direcionou a raiva para uma comparação sutil entre suas pesquisas e o que a aluna tinha acabado de dizer. Praticamente ignorou-a.
 
Como podemos ver, não é nada agradável ser discriminado por ser deste ou daquele signo. O primeiro atributo de um astrólogo é ser imparcial, principalmente porque todos nós temos todos os signos em nossos mapas. Há uma infinidade de dados a considerar antes de termos o perfil de alguém. Mesmo assim, temos que saber que esse alguém está crescendo espiritualmente e pode estar numa fase que contrarie tudo o que os manuais falam sobre o comportamento genérico de cada símbolo arquetípico.
 
Um problema de inaceitação ou de intolerância com relação a uma determinada manifestação arquetípica, fatalmente indica que em certa área da vida, há o mesmo problema na vida daquele indivíduo. É só verificarmos o sistema de domificação do mapa de uma pessoa (as casas astrológicas) e vermos em que ponto o signo "odiado" está. Daí perceberemos que há muito pouca ou nenhuma atenção dada a esse setor vital. É preciso que este ser reorganize sua vida a partir de tais dificuldades.
 
Se continuarmos a estudar Astrologia com o intuito de nos colocarmos num pedestal de perfeição ilusória, das duas uma: ou, um dia, todos se atracam pelas ruas querendo provar quem é melhor, ou todos vão se suicidar, pois todas aquelas pessoas odiadas estão dentro de nós.
Não é mais fácil, então, refletir sobre nossos preconceitos? A origem deles não é astrológica, mas sim humana. A Astrologia pode ajudar a abrandá-los. Jamais deve ser um instrumento para gerar ainda mais problemas.

Carlos Hollanda