Os Primórdios da Astrologia
e o Tempo da Mãe
Paulo Duboc - fale com o autor

Dividamos a história em 3 fases e conceituamos um tempo onde as coisas começaram. E quem vamos encontrar em primeiro lugar: a mãe. No começo tudo se relacionava a ela, pois que a presença materna revela algo que é certo existir “antes do eu “ e de quem esse “eu” se torna dependente. O campo de visão dos seres humanos era a natureza, simbolizada na idade mais remota pela mãe associada à natureza como uma questão objetiva, imediata e real e mais tarde, pelo Sol, pela Lua e estrelas como questões subjetivas, distantes, não reais nem palpáveis mas capazes de dirigir os destinos da natureza.

A Lua sempre foi associada à mulher. Merece atenção o trabalho da pesquisadora pátria Cláudia Lúcia Araujo . Começa por citar a Lua e a questão da fertilidade e fala da questão do Matriarcado:

Nesse período, na fase matriarcal, essa energia do feminino era representada pela imagem das deusas que se encontravam diretamente ligadas à terra, à fertilidade e à energia que gerava a vida sendo que as deusas da lua eram também as deusas da terra, as representantes do poder Yin, que na China é tanto a terra como a lua, o poder fecundante do femininio.

Uma vez que essa mãe-natureza, fecundante e criativa, gerava a idéia do princípio, foi o suficiente para que se criassem os Deuses. Ainda Claudia Araújo identifica no Zohar a primeira forma de reverência a “ um domínio interior “ onde a lua sempre teria mais força até que o Sol viesse a eclipsar seu Poder.

Deus criou duas luzes. As duas luzes ascenderam juntas com a mesma dignidade. A Lua porém não estava à vontade com o sol e na verdade, cada um se sentia mortificado pelo outro.... quando a Lua estava em conexão com o sol era luminosa; mas tão logo se separou e foi-lhe atribuído o comando de suas próprias hostes, ela reduziu sua posição e sua luz.” Prossegue a autora: . .“quando falamos nas deusas, como fica evidente não nos referimos a nenhuma mulher, mas sim a algo não-humano, a uma energia, um poder arquetípico, cíclico, ligado ao feminino e da mesma natureza que a mulher, embora atuando em ambos os sexos.

Nessa mesma fase ocorre a criação dos Deuses, sendo nominados na seqüência tradicional, Sol, Lua, Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter, e Saturno. Porém a tradição do feminino e a questão da Mãe-natureza sugere teriam vindo , tudo e todos, do Caos Primordial* , e nesse caso, em posição hierárquica, os deuses seriam filhos “ ab caos”** . Ainda mais, segundo a Tradição, “todo Universo, o Cosmos e a Terra seriam a associação da maternidade a uma exigência de início” A mãe, a mulher, a fêmea, a função feminina teria vindo em primeiro lugar, teria gerados os deuses, tendo sido a primeira forma gestora do universo.

* O Caos Primordial é o antecessor do Universo ordenado. Esse estado onde a massa está infusa seria segundo Jung, um arquétipo , ou tipo arcaico existente em latência no ser humano. Do original grego, o significado é “abismo bocejante “. trata-se de um estado de copleta desordem anteriormente anteriormente à formação do mundo. Essa idéia foi combatida por alguns filósofos, como Aristóteles que considerava existir a eternidade do mundo.

** Os Deuses seriam provenientes ( ab ) do caos, ou principio que se assemelhava a mãe

Os primeiros testemunhos do despertar da consciência ancestral exprimem a idéia da fêmea como geradora de tudo. Era assim em toda a natureza, também eram assim a partir de cima para baixo. O crescimento da idéia atinge um nível absoluto em todos os lugares, e numa espécie de sincronicidade, “sacraliza-se” a mulher, colocando-a no Altar da Criação. A Mãe geradora, paridora, deusa, sagrada, amada, seria importante para a orientação da terra, o plantio e a colheita. A agricultura incipiente ainda nos primórdios era questionada face as questões sazonais, as intempéries, mudanças de climas. Mas nessa fase ainda os homens não estavam interessados diretamente na questão social, senão na questão do medo proveniente da morte ou “fim da vida “ . Segundo S. M. Neslle, era ela, a Mãe quem fornecia segurança ao grupo, à clã, à tribo.

Em sua relação direta com a Mãe sacralizada, o homem passa a ter mais necessidade de conhecimentos para viver melhor pelo uso da Natureza. Nesse momento começa a interrogação à mãe-natureza. Face o que se depreende do estudo da Tradição Primordial, a Astrologia , por sua facilitação simbólica, passa a ser o fruto direto dessa interrogação. Quando se interrogavam os astros, havia uma natural interrogação à Mãe, e somente ela seria capaz de responder com facilidade qualquer dúvida existencial humana. A Astrologia, desde sempre, recebe duas nominações: uma, mítica, “Grande-mãe” outra comum, carinhosa e popular: Velha-Senhora.

Paleolítico - 80.000 - 25.000

A figura da mulher, simbolizada pela mãe, sacralizada no altar do questionamento, passa a exercer um Poder sobre a criação.. Lentamente a mulher erige-se em Deusa e no transcorrer de um tempo imenso onde o mito e a lenda se associam na imaginação do Ser Humano, cresce e se fixa a idéia da mulher-deusa, de tal forma que sua extensão natural é a nível de Grande Deusa* durante todo o Paleolítico. Associada à Lua pela função feminina, pela relação com a natureza geratriz, a gravidez, a mulher-mãe-deusa assume o pódio e passar a dirigir os ciclos existenciais. A partir disso há registros do Homem medindo sua existência pelos ritmos da Mãe-eterna, simbolizada pela Lua em suas quatro fases, crescente, minguante, cheia e nova. As diferentes etapas da Lua pareciam reproduzir para o homem já evoluído as fases de fecundação da Mulher. Segundo Claudia L. Araujo, “ as deusas representam uma energia que contém em si tanto o aspecto positivo do feminino ( Lua crescente ) quanto o aspecto negativo ( lua minguante ). O encontro com a Deusa traz renovação para a vida, capaz de alimentar a paixão, o amor e proporcionar a fertilidade”.

* Nessa fase a Grande Deusa é filha da Grande-Mãe, e se relaciona com os Deuses planetários ou celestiais. Essa fase é mais pela “ sacralização ‘ ou veneração da imagem feminina, à nível do endeusamento.

Interessante acentuar o fato de que nessa fase, a imagem da Deusa, adorada “como um cone ou um pilar de pedra cuja imagem é bastante próxima da do falo é um referência ao seu poder fecundante. Nessa mesma fase ela é ainda representada pelo seu aspecto animal. Ártemis era uma ursa, Cibele uma Leoa e Isis era Hator, a deusa-vaca egípcia, uma vez que a natureza da mulher era tida basicamente como um instinto animal. (Claudio L. Araujo).

O mesolítico - 8.000 a 6.000 anos

Nesse período ocorre a civilização agrícola e em conseqüência aumenta-se a sacralidade feminina. Vênus passa a ter importância primordial na terra., na comunidade, na tribo, na evolução social. A Mãe-Vênus estiliza um arquétipo, sacraliza o tempo, o espaço e a comunidade. Sem ela nada poderia existir. Através dela cria-se o primeiro embrião da sociedade. Estabelece-se o culto da Deusa-mãe, inaugurando-se uma fase importante onde a sociedade se organiza e se desenvolve consideravelmente em redor da Grande-Vênus ainda inominada, mas soberana na Cidade-Estado . Os códigos religiosos e jurídicos são sua obra. Embora se constate a existência do Rei, ele não é senão um representante do filho da Grande Deusa. A Lua, Vênus, Mercúrio e o Sol formam um movimento adequado a fazer permanecer a sacralidade feminina.

O Neolítico - 4.000 a 3.000 a.C.

Nessa fase se nominaliza a Deusa-mãe em todos os lugares. Na Mesopotâmia recebe o nome de Tiamat, Nana, Ihstar e Astarte. Na Frígia, é conhecida como Cibele. No Egito é a Isis com seu famoso véu: “Nenhum mortal me desvelará “. Na Grécia é Demeter. Marcelo Baglione* em notável síntese, acentua a força do feminismo e sua intensidade de tal sorte que a própria mitologia grega favorece às deusas uma “revolta contra a sua situação de eterna e incessante geradora de vida”. Assim “ Geia força Cronos a castrar seu Pai com uma foice, pondo fim ao suplício procriativo de sua Mãe”. Efetivamente o mesmo ocorre com Isis e seu filho Orus na notável Lenda de Osiris** que é parte integrante dos estudos nos centros esotéricos e iniciáticos.

Portanto, o culto da Grande-deusa personifica a Psique arcaica. Embora precariamente, a Astrologia, durante essa fase, recorre a Deusa-Mãe, através do culto à Lua e principalmente a Vênus. Pelo menos é uma forma de mostrar a imagem simbólica da mulher-mãe estilizada sobretudo na Vênus.

Uma parte do Neolítico ( 4.000 a 2.000 ) vê o surgimento dos Mitos. Eis um instante em que se constrói uma base astrológica quanto o mito exerce fascínio na infância. O corpo astrologico, ainda hoje, retoma nossa mitos da infância, quando estamos ligados a Mãe-tôda-poderosa. Em verdade, os deuses planetários e sua simbólica, hoje enriquecida com o advento de profundos estudos , assinalam o tema do Nascimento. Interrogar os astros é interrogar a mãe.

O ato de Nascimento da Astrologia

Como se infere, existe uma passagem do culto da Deusa-mãe para a Grande-Deusa. A pesquisadora francesa e astróloga Solange Maylle Nesle concebe esta passagem “ como uma separação progressiva acarretando necessariamente uma simbolização correspondente do homem à realidade concreta da mãe.” O que podemos evidenciar é que a história do homem é a própria história da humanidade. O bebê, tal como a humanidade, tem a Deusa-mãe em sua chegada como um “ a priori” divino. Ao longo do tempo, separa-se do arquétipo e simboliza sua mãe como Grande Deusa. Ao longo de sua evolução, separa-se da mãe, sacraliza o Pai, se mantém sob o guante do Pai-Castrador e finalmente retorna para a Grande-mãe Urania, a libertação. Embora pareça um retorno, em verdade é uma lenta evolução o que pressupõe a existência de um quadro de referência individual. Esse quadro de referência é o Sistema Solar onde se encontra o arquétipo da Deusa-mulher e mãe, representado na primeira fase do Homem pela Lua

A lenta evolução da Astrologia faz emergir do Tempo uma relação com a natureza. Florestas, rios, montanhas, lago, toda a natureza estabelece uma linguagem que permite desenvolver o sobrenatural escondido no seio materno. A “ alma da mãe “ é projetada num espaço mais longínquo, o céu. A Deusa e os Deuses adquirem uma identidade e investem a realidade objetiva de sua psique. Constituem a “Matrix Primordialis “*** de que se dá conta Jung, um “espaço” de energia que contém em estado potencial a universalidade humana. Tal “matriz “ encerra uma energia que a pesquisa moderna entende como Banda Zodiacal e se relaciona com a função genética**** do ser humano. A Astrologia é uma das mais formas estruturadas para interrogar o mundo divino dos arquétipos. Os primórdios da prática astrológica manifestam a expansão do campo da consciência, uma abertura ao mundo e ao universo. A Astrologia permitiu ao Homem descobrir que a Mãe-natureza pode lhe falar por intermédio do céu.

* Emissários da Nova Era - Record, Nova Era, 1996. Marcelo Baghone é um pensador moderno na primeira linha dos pensadores brasileiros no que ele mesmo denomina “transvanguarda “ da Astrologia.

** Essa Lenda passa a ser conhecida como Lenda do 3º grau e tornou-se um Landmark, ou Limite obrigatório e válido para se reconhecer o ambiente maçônico. Sem essa lenda não existe autenticidade no “ parquet “ maçônico.

*** Jung, citado por Marie Louise von Franz, Number and Time, diz que ( trad. nossa) enquanto um setor da região inconsciente é realmente pessoal e consiste de complexos pessoais, um outra porção é univrsalmente humana e parece ter a mesma estrutura em cada indivíduo. Jung chama de Inconsciente Coletivo, uma “ matrix “ criativa viva de nossas funções conscientes e inconscientes.

**** As mais avançadas pesquisas tendem a consagrar uma relação entre a ciência genética e espaço coberto pela Banda Zodiacal. Durante esse livo teremos oportunidade de abordar a temática nesse sentido.

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