Astrologia e Valor Subjetivo

Vanessa Tuleski

 

Quanto vale uma consulta?

Recentemente escrevi um artigo sobre a questão das constantes solicitações que os astrólogos recebem para fazerem trabalhos gratuitos. O artigo foi escrito e publicado em uma Lua em Aquário, e gerou muitas respostas. Em um trecho do artigo, afirmei que outros profissionais ligados a profissões de ajuda não eram tão solicitados para trabalharem de graça. Porém, segundo testemunhos posteriores que recebi, isto também ocorre com alguma freqüência, embora, perdoem-me outros profissionais, mas tenho certeza e que não com a freqüência com que ocorre para os astrólogos, simplesmente porque este comportamento tem duas raízes básicas.

A primeira delas está na forma como a astrologia chegou para o público. Boa parte do público entra em contato com a astrologia através de horóscopos de jornais e revistas. Nestes veículos, o conhecimento está disponível de forma aparentemente gratuita. O que o público esquece é que a revista ou o jornal paga o profissional. Assim, em uma coluna do tipo ‘tira dúvidas’, o profissional pode não estar recebendo do leitor, mas está sendo remunerado para fazer aquilo. Entretanto, as pessoas continuam a imaginar esta disponibilidade fora do contexto de um veículo de comunicação. A questão da sobrevivência do profissional não é recordada, e tampouco vêem o astrólogo como um profissional. Na visão da maioria das pessoas, o astrólogo é um ‘místico’, e um místico é um sujeito que, de acordo com esta acepção, no mínimo ‘atrai o seu ganha pão’ ou algo parecido. É como se ele resolvesse isto ou estivesse acima disso, e disponível para responder a todo tipo de pergunta, e seu tempo fosse infinito.

Este viés de místico também ocorre porque antes do surgimento da Psicologia, o aconselhamento era algo que se fazia basicamente no âmbito religioso. Quem fazia o papel de aconselhar era o padre, o pastor, o rabino. Porém, estes padres e pastores tinham uma fonte de sustento no advinda das próprias doações dos fiéis. Assim, alimentados e com suas necessidades básicas garantidas, podiam prestar este tipo de serviço a comunidade que os sustentava. De uma certa forma, é isto que se espera dos astrólogos, com a diferença de que ninguém lembra de que não há nenhuma entidade os sustentando. Porém, espera-se que sejam bons e ‘ajudem as pessoas’ respondendo suas dúvidas gratuitamente. Sua profissão é vista como de ‘ajuda’, mas não se questiona quem ou o que vai ajudar os astrólogos para que eles possam ajudar alguém, como aconteceria no modelo religioso.

Há também um outro fator que influi nesta abordagem de se esperar que o astrólogo trabalhe gratuitamente. Em uma sociedade de consumo, o bem tangível, material, tem mais valor do que o chamado bem abstrato, que é a matéria prima da astrologia, da psicologia e de qualquer consultoria. Assim, em um primeiro momento, não se valoriza a informação. Parece abstrata demais para valer algo. Mas quando este conhecimento começa a ‘funcionar’ e a fazer diferença, aí ele pode começar a ganhar valor, e muito.
Podemos dizer que o bem tangível pertence ao âmbito de Touro, signo material, físico. As pessoas parecem ter maior facilidade em compreender e aceitar os valores de bens tangílveis, pois este se torna rapidamente conhecido. Este conhecimento do valor faz com que um bem tangível possa ser novamente comercializado. Aquilo que é abstrato não tem um valor tão facilmente reconhecido. O que é abstrato tem um valor subjetivo, que, como nos bens materiais, varia de baixo a incomensurável. Por exemplo, determinadas viagens têm valores incomensuráveis. Podem mudar a vida das pessoas, podem significar muito, não só no momento como por toda uma vida. Amizades também podem ter valores incomensuráveis.

BEM ABSTRATO
E VALOR CALCULADO

Quase sempre aquilo que chamamos de ‘bem abstrato’ tem o valor calculado por fatores concretos e também subjetivos. Suponhamos que você se consulte com um psicólogo. Para que ele possa ser psicólogo, ele precisa de um espaço físico para encontrá-lo e de um ambiente adequado, e você paga por este espaço. Há também o fator tempo. Nós pagamos pelo tempo de um profissional. Nós também pagamos pelo fator experiência, competência, e tudo mais. Tudo isto está agregado a um valor abstrato, da mesma forma que objetos concretos também tem valores abstratos agregados. Por exemplo, o fato de algo ser lançamento pode custar mais caro por ser uma novidade que todo mundo quer. Se algo se torna um objeto de desejo é óbvio que isto influi no preço final, e não só a matéria prima e mão de obra que fazem parte do valor daquele objeto.

De qualquer maneira, em uma sociedade muito voltada para o consumo, objetos tendem, de um modo geral, a serem mais facilmente compreendidos do que aquilo que é abstrato. Até porque objetos podem ser trocados, cobiçados, e aquilo que é abstrato depende do aproveitamento da pessoa, enquanto que algo físico, não. Se eu comprar um celular e não gostar dele, eu o vendo. Mas se eu pagar uma consulta e não gostar, não há como recuperar isto. O valor se perdeu naquele momento. Talvez uma informação valiosa percebida mais tarde me faça reconsiderar o valor daquilo. O valor de algo abstrato, portanto, vai depender essencialmente do que você vai achar daquilo, do uso que você será capaz de fazer daquilo. Assim, por exemplo, eu posso, como astrólogo, psicólogo ou outra profissão que lide com bens abstratos, estar prestando um ótimo trabalho, mas se você não notá-lo, se você não fizer a sua parte, ele não fará sentido, diferente de algo material que já tem um valor socialmente apontado e conhecido por todos. O que é abstrato não pode ser visto por todos e compartilhado tão facilmente quanto o que é tangível. Muitas vezes, o que é abstrato depende do quanto você mesmo já valoriza aquilo a priori e o quanto está disposto a aproveitar aquilo. Assim, por exemplo, uma viagem ao Egito pode ser algo riquíssimo para uma pessoa e uma coisa banal e meio folclórica para outra. Porém, eu também posso ser uma pessoa que não entenda nada sobre o Egito, ir até lá, ficar de alguma forma tocado pelo que vi e começar a ler e pesquisar a respeito. É assim que funciona um valor abstrato: ela passa necessariamente pela percepção pessoal.

Podemos dizer que tudo o que é concreto pertence a esfera do signo de Touro, e tudo o que abstrato, a esfera de Escorpião, signo oposto a Touro. O que é concreto é algo taurino na medida em que se trata de um valor conhecido e compartilhado por todos, e em que há um bem que pode ser reaproveitado se necessário. O que é abstrato, não. O que é abstrato só vai ter sentido na esfera íntima. Só eu posso dizer que se uma viagem foi maravilhosa ou não. E isto nem sempre acompanha o material. Posso ter acesso aos melhores hotéis, restaurantes, ter toda assistência, mas, se eu não estiver bem, a viagem não será boa para mim. Da mesma forma que posso estar de mochila nas costas, com o dinheiro contado e achar que a viagem está sendo ótima.

ESCORPIÃO E O
VALOR NÃO CONCRETO

Aquilo que é abstrato também pertence a esfera de Escorpião na medida em que nenhum outro signo é capaz de ver ou descobrir valor em algo que ‘ainda não tem valor’, ou em algo cujo valor esteja ocultado por algum outro fator. A forma como Escorpião reconhece isto é através da emoção ou do impacto. Assim, por exemplo, se algo tem impacto sobre mim aquilo passa a ter valor. Este seria o caso de sessões de terapia ou mesmo de uma consulta astrológica (em que o produto é a informação). Escorpião também não se guia pelas aparências. Isto não quer dizer que não as note e muito menos que tenha de desprezá-las. A questão é não se guiar, porque você só vai descobrir o valor verdadeiro de algo se puder ir além das aparências. Usando um exemplo banal, digamos que lhe seja servida uma fina refeição em um restaurante sofisticado com um vinho com um rótulo reluzente. Provavelmente, isto vai significar que a comida seja boa, mas não necessariamente. Este ‘não necessariamente’ é Escorpião quem diz. Escorpião está disposto a diminuir o valor externo daquilo que está inflacionado e aumentar o valor do que está diminuído. É Escorpião quem transforma. Feito isto, o assunto passará a esfera de Touro, que, como signo complementar a Escorpião, vai representar o ‘valor assimilado’, estabilizado, reconhecido.

Pois bem: o que a astrologia não tem é este valor reconhecido. Ela está mal posicionada, porque a maioria das pessoas desconhece o seu alcance, a forma como ela funciona e para que ela serve. Ela é valorizada por coisas que não é, e não é valorizada pelo que ela é. E para que a astrologia seja valorizada é preciso tirar-lhe o turbante dourado que nada tem a ver com ela, suas roupas cafonas, e repaginá-la como algo capaz de fornecer informações úteis para as pessoas, que ultrapassem o superficial e ajudem a refletir a respeito da vida delas, ao invés de dar as tradicionais respostas superficiais e tolas, como, por exemplo, as folclóricas e inúteis combinações de signos solares. Para que a astrologia cresça como estudo (que é a sua essência), é preciso se desfazer mitos e idéias errôneas a respeito dela (e são vários). Só assim ela passará a ser reconhecida em seu valor subjetivo e os profissionais que se dedicam a ela serão vistos desta forma.