Astrologia no Banco dos Réus
Perguntas
e Respostas
Conexão
Zigurat

 

2- Em Defesa da Sensibilidade

Marcelo Borges

Céticos devem ser pessoas tristes, vazias, mas isso não lhes dá o direito de se valerem de práticas anti-éticas, como a deliberada distorção de fatos para que se ajustem a seus próprios interesses.

Há mais de dez anos, traduzi um livro chamado "Em defesa da astrologia" para a Siciliano, escrito por John Anthony West, egiptólogo e escritor. Nele, o autor coletava as evidências a favor da validade da astrologia e mostrava a vacuidade dos argumentos contrários a ela, inclusive o notório caso do CSICOP (Committee for the Scientific Investigation of Claims of the Paranormal). Sugiro que os interessados visitem o site que dá a história toda narrada por um participante direto, mostrando como esse suposto Comitê de defensores da verdade (ha!) manipulou dados para tentar reduzir o peso dos resultados dos estudos de Gauquelin: http://www.psicounsel.com/starbaby.html

Um outro site interessante para quem deseja se munir de mais argumentos é: http://www.survivalscience.org/debunk/default.shtml. Eles mostram as inconsistências dos "debunkers" (profissionais que, em suposto nome da ciência, procuram desmontar - daí o nome - os "charlatães").

Abaixo, uma resposta a um artigo escrito por um cientista da USP, Isaias Raw, que em seu artigo na Revista da Folha "Em Defesa da Razão", ataca o que ele chama de "pseudociências". Peço atenção para o trecho do discurso de William James, psicólogo e filósofo americano, proferido em Harvard em 1895.

EM DEFESA DA SENSIBILIDADE

Ao ler "Em defesa da razão", senti no artigo um vago ar de nostalgia vitoriana. Contudo, seria natural que o seu autor se manifestasse assim, em coerência com o lado da moeda razão/sensibilidade por ele contemplado ao longo de seus respeitáveis 70 anos.

Não cheguei a essa idade. Estou com 47 anos e meus dois cursos universitários, engenharia eletrônica e direito, exigiram muito da razão e pouco da sensibilidade. Nem por isso falo mal de coisas que desconheça, estranhas a meu escopo de conhecimentos. Se não estudei algum tema, muito pouco posso afirmar a seu respeito. Creio, porém, que a melhor atitude diante dos fatos da vida é uma abertura tranqüila, pois aprendemos que não é possível reduzir tudo a fórmulas, equações ou leis.

O artigo defendeu o cientificismo. O Aurélio o define como a "atitude segundo a qual a ciência dá a conhecer as coisas como são, resolve todos os reais problemas da humanidade e é suficiente para satisfazer todas as necessidades legítimas da inteligência humana".

William James, filósofo e um dos pioneiros da psicologia norte-americana, escreveu em 1895 a respeito dessa onipotência. Lembrou que o ídolo da mente materialista, que só consegue admitir fatos concretos, é a Ciência, e que a predileção pela palavra "cientista" é um dos sinais para distinguirmos seus devotos. A maneira mais fácil que conhecem para liquidar uma opinião diferente da sua é chamá-la de "não-científica"... Diz ainda o eminente pensador: "Recente é a carreira da ciência. Devemos acreditar que um conhecimento tão embrionário pode representar mais do que um ínfimo vislumbre acerca do Universo...? Não! Nossa Ciência é apenas uma gota, nossa ignorância um oceano". Esta analogia também foi feita por Sir Isaac Newton, que se sentia um menino brincando na areia com pedrinhas lisas ou conchas diferentes, "enquanto o vasto oceano da verdade se estende à minha frente, desconhecido".

Seria muita pretensão de nossa parte imaginar que a Ciência é o remédio para todos os males da Humanidade ou que, se ela não pode explicar algo, esse algo não merece crédito por não ser "científico". Talvez o articulista imagine que as pessoas encontrem alento e esperança lendo um manual de Física ou um tratado sobre Química Inorgânica. A Ciência desacompanhada da emoção produz, por exemplo, coisas como a bomba nuclear. Oppenheimer, um dos seus criadores, exclamou, ao vê-la explodir pela primeira vez e se arrepender de sua obra: "Tornei-me a Morte, destruidora de mundos". Será à toa que alguns dos países técnica e cientificamente mais desenvolvidos do mundo, como os escandinavos, apresentem os maiores índices de suicídio? Tanto a Ciência como a emoção (ou sensibilidade, ou fé, ou intuição) têm lugar na vida humana, e um não exclui o outro.

Depreciar a emoção como antítese da razão é justamente o oposto do que vemos hoje em termos internacionais, mesmo em áreas como a neurologia: a valorização da emoção, de que tratam best-sellers mundiais como O erro de Descartes e Inteligência emocional.

Ao lançar à vala comum das coisas charlatanescas astrologia, ufologia, cura mediúnica, duendes e anjos, etc., bem como seus praticantes ou crentes, o artigo finge ignorar a incapacidade da ciência em medir esses fenômenos ou despreza os registros já existentes de sua validade.

Não é verdade, por exemplo, que OVNI's não são detectados por radares: um dos casos mais incontroversos de manifestação ufológica ocorreu no Brasil em 1986, quando o próprio Ministro da Aeronáutica se manifestou a respeito e o então Presidente da EMBRAER declarou ter visto um objeto. (Se eventualmente os OVNI's não fossem captados por radares, isso só teria a depor contra nossa capacidade de detecção...)

Desancar a astrologia por meio dos horóscopos de jornal é um recurso fácil, mas trata-se de coisas muito diferentes. O matemático e psicólogo francês Michel Gauquelin, por exemplo, dedicou trinta anos de sua vida a estudar estatisticamente a astrologia, concluindo que algumas de suas premissas são absolutamente válidas. (Aliás, a respeito, leia-se o excelente livro Em defesa da astrologia, de John Anthony West, que tive a oportunidade de traduzir, onde se vê o esforço fraudulento de organizações norte-americanas de céticos para tentar desacreditar a astrologia.)

Charlatães são encontrados em todas as áreas do conhecimento humano, e um professor em faculdade de medicina - como é o caso de Isaías Raw - deve ter visto tantos casos de maus profissionais em sua área quanto os há na engenharia ou no direito. Mas chamar de charlatonas pessoas dedicadas a auxiliar os outros a se conhecerem melhor ou a explicar mistérios do universo que a ciência não se dispõe a estudar ou não pode fazê-lo é, no mínimo, precipitado.

Finalmente, é bom lembrar que a Constituição brasileira dá a todos o direito à liberdade de crença e de opinião, e que a nova Inquisição - a que o artigo parece pretender que "os governos e lideranças" submetam pessoas que acreditam em duendes e anjos - poderia, isso sim, traduzir-se por uma legislação que ponha fim a todo e qualquer corporativismo, levando a julgamento e eventual condenação e cassando realmente o exercício dos maus profissionais, especialmente daqueles que têm em suas mãos vidas humanas."

Volta para o topo