Todas as Dores do Mundo
por Andréa Bianchi

Algumas pessoas sofrem do mal chamado hipocondria, nada mais nada menos do que mania de doença.

Em minhas observações por aí destaquei duas espécies: os que adoram ser hipocondríacos e os que detestam.

Os que adoram são incorrigíveis. Eles realmente curtem quando você diz que estão pálidos ou quando descrevemos alguns novos sintomas das doenças novas. Convivo com um assim. Agora ele está ficando mais velho e acredito feliz por realmente ter alguns probleminhas de colesterol, faz aquela cara quando diz: “Isso eu não posso comer, faz um mal terrível para a minha saúde”. Sua expressão é um misto de contentamento com sofreguidão.

Os que detestam procuram a terapia. “Não descreve nada para mim, por favor!! Eu sinto tudo depois é horrível”. Esses eu tenho realmente que lamentar por eles, não escolheram ser hipocondríacos e gostariam sinceramente de mudar.

Agora como classificar uma pessoa com mania de sofrimento? Não sou psicóloga, mas deve haver um nome para isso….. Por hora classifico de “todas as dores do mundo”

As pessoas que sofrem de “todas as dores do mundo” são como minha amiga Marta. Martinha sempre sofreu muito na vida, não me perguntem o motivo.

Não me lembro muito bem do primeiro namorado dela, mas não sei o que ele pode ter feito de tão grave para que ela se sentisse uma fracassada eterna no amor. Mas isso não importa, o importante é a dor imensa que Marta sente, todos os homens do mundo jamais entenderão o porquê da questão, mas sempre a fazem sofrer, não importa o que façam de bom.

Martinha aos 18 já havia tido mais desilusões amorosas do que as mulheres vividas de 40 anos. Sempre teve um ar de solteirona, mesmo numa idade em que a solteirice lhe caia as maravilhas. “Nunca vou me casar, nasci para viver sozinha, ninguém me compreende”. Acho mesmo que não.

Se alguém ficava doente ela logo ia dizendo que a vida não tinha remédio: “Nascemos todos para sofrer”. Na verdade, Marta sofreu algumas perdas irreparáveis, mas nada excepcional. O que era realmente excepcional era a sua capacidade de transformar uma doença num mal incurável, uma perda numa catástrofe e uma relação num fracasso total.

Quando Marta encontrava um cara divertido, nem assim deixava de desconfiar, parecia estar a espera de uma pancada na cabeça que a derrubasse. Era seu destino. Sim, Marta acreditava no destino. Não era qualquer destino, mas um destino horrível que a condenara a não importa como, nem porque, sofrer infinitamente.

Martinha com o passar do tempo foi conquistando e perdendo todas as coisas. Acho mesmo que se programou para isso. Quanto mais ela reclamava eu tinha a certeza: Marta gosta de perder. Eram momentos férteis para ela. A dor a alimentava e ela podia expressá-la através da arte. Quadros. Quadros muito negros e tristes. Bons, mas negros e tristes.

Quem a conhecia dizia que tinha tudo para dar certo. Ela desconfiava “Mas logo eu? Não eu não nasci para ser feliz.” Argumento nenhum do mundo a demovia dessa idéia.

Algumas vezes alguém tentava lhe mostrar que suas próprias dores não eram diferentes das do resto da humanidade. “Só eu sei o que é sofrer……. Você já viveu isso??” E seguia jogando na cara das pessoas suas dores, para provar o quanto sofria.

Olhando Marta tenho vontade de dizê-la o quanto é bonita. Conheço muitas pessoas que gostariam de ter uma figura tão esbelta quanto ela, ou a mesma cor de olhos. Mas desisti, das vezes que tentei acho que a ofendi com a possibilidade de ela não ser a criatura mais perdedora do universo.

Simpatizo muito com Marta e admiro o seu trabalho, talvez seja a única solução mesmo para ela. Um dia talvez até fique famosa como Van Gogh que também sofria muito. Seria a alma do artista portadora de “todos os males do mundo”??

Alguns poetas dizem só serem capazes de escrever quando muito deprimidos. As melhores canções falam de um amor fracassado, por que? Será realmente necessário sublimar a dor?

Marta segue sua vida sofrendo, apesar de ter uma saúde de ferro, um namorado, amigos, família, estabilidade e talento. Realmente ela tem conseguido viver o que programou.

Mas existem também os que sentem “todas as dores do mundo” e entram na real depressão. Uma doença que vem realmente assustando os médicos porque as pessoas em depressão não conseguem ter uma vida normal. Não conseguem fazer de forma plena e satisfatória coisas simples como se relacionar com as pessoas, sair de casa, ter namorado, fazer amigos, trabalhar, comer, dormir. Essas realmente sofrem, gritam por socorro e quando socorridas se tornam pessoas saudáveis outra vez.

Falam os médicos também de uma “síndrome do pânico”, ainda mais grave que a depressão e que também já tem tratamento.

E Marta? Ela não sofre de depressão, nem de síndrome do pânico, ao que parece…. Haveria uma cura para Marta?